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4 de abril de 2015

Os abutres voltam a nidificar no Alentejo


Pesa até 13 quilos e pode atingir 2,80 metros de asas abertas. E tem uma história nova que envolve o Alentejo
Há mais de 40 anos que a maior ave de rapina da Europa não nidificava a Sul do Tejo. "Os abutres são filopátricos, ou seja, são muito fiéis ao local onde nascem e são gregários - gostam de formar colónias."



Dois casais de abutre-preto aproveitaram os ninhos artificiais erguidos na Herdade da Contenda, no concelho de Moura, para se instalarem e constituírem família. Apenas um deles já fez a postura de um ovo. O outro ainda está a preparar o ninho. Se tudo correr bem, o ovo posto deverá eclodir dentro de dois meses. E se a cria for viável, começará a voar lá para agosto ou setembro.

Para já, apenas dois dos 30 ninhos artificiais colocados pela Liga para a Proteção da Natureza (LPN), na zona de Moura-Barrancos, foram ocupados, mas esta é já uma grande conquista. "São processos longos e imprevisíveis e podem passar-se anos sem que se forme uma nova colónia num determinado local", explica Eduardo Santos, coordenador do Projeto Life Lince Abutre (2010-2014), desenvolvido pela LPN em parceria com a Flora e Fauna Internacional e o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). O projeto terminou em setembro, mas continua sob monitorização. E um dos objetivos - que era ver abutres-pretos a reproduzirem-se no Alentejo - foi alcançado. Tal não acontecia há mais de 40 anos por aquelas paragens.

"Os abutres são filopátricos, ou seja, são muito fiéis ao local onde nascem e são gregários - gostam de formar colónias", conta Eduardo Santos. Por isso, a ocupação destes dois ninhos é uma excelente notícia, pois significa "o restabelecimento de um núcleo reprodutor desta ave na região, após várias décadas". E isto em poucos anos, já que o projeto Life decorreu nos últimos cinco anos e os ninhos foram ali colocados entre 2012 e 2014.




Um projeto de €2,6 milhões

Desde que o projeto começou, com a criação de campos de alimentação para estas aves necrófagas, que aumentou o número de abutres-pretos a sobrevoar os campos alentejanos, vindos de colónias dispersas em Espanha. O abutre é um predador de topo que tem uma função de limpeza sanitária do ecossistema, mas as alterações na paisagem agrícola, a fragmentação do habitat e a redução de alimento disponível - já que a legislação europeia proíbe o abandono do gado doméstico que morre no campo - fizeram com que fosse necessário encontrar alternativas para tornar a região novamente atraente para estas aves necrófagas, que por aqui deixaram de nidificar nos anos 70.

O Life Lince Abutre contou com um investimento de €2,6 milhões de euros (75% comparticipados por Bruxelas) para criar as condições para conservar e recuperar a paisagem mediterrânica do sudeste alentejano e algarvio, considerada ideal para que o lince ibérico e o abutre-preto voltassem a encontrar o habitat adequado para se reproduzirem em Portugal.



Em perigo crítico

O Aegypius monachus está em perigo crítico em Portugal e em situação vulnerável em Espanha. É considerada a maior ave de rapina da Europa e uma das maiores do mundo. Pesa entre 7 e 13 quilos e, de asas abertas, pode atingir uma envergadura de 2,80 metros. Tem uma plumagem uniforme castanha escura e a cabeça coberta por uma penugem que vai aclarando com a idade.

Em Portugal existe uma colónia de abutres-pretos que recomeçou a nidificar no Tejo Internacional em 2010, fruto também de um projeto de conservação da Quercus e do ICNF, e apenas mais um casal nidificante isolado no Douro Internacional.

A espécie existe em Espanha, Portugal, França, Grécia, Bulgária, Turquia e Macedónia. Estimam-se cerca de dois mil casais na Península Ibérica, a maioria em Espanha. O abutre-preto pode viver até aos 20-25 anos e alimenta-se de carne putrefacta. Precisa de mais de 200 quilos de carne por ano, mas não tem de comer todos os dias.

Expresso - texto de Carla Tomás e fotos de José Ventura